A derrota da seleção brasileira, neste 02 de julho de 2010, me trouxe de volta a este ambiente, basicamente por duas razões.
A primeira delas diz respeito ao próprio nome do blog e ao que, suponho, se passou com muitos brasileiros nas últimas semanas. A Copa 2010 tomou conta de pensamentos e palavras, atos e omissões (meu passado católico sempre me persegue), digo, tornou-se o assunto do momento, sem espaço para muitos concorrentes, em minha opinião. O evento, que não tinha por nome oficial Hexa 2010, entrou na nossa agenda sem pedir licença e gerou expectativas de toda ordem. Velhas melodias, conhecidas vozes condutoras de nossas emoções (ainda que tantos tenham implorado para que se calassem), propagandas engraçadinhas na TV, álbuns de figurinhas, o verde e amarelo nas ruas, e toda uma série de conhecidos estímulos, associados a alguns novos (vuvuzelas & Cia) controlaram nosso comportamento de tal forma que ousei divagar (cá comigo) sobre as consequências de uma drástica redução em nossas possibilidades de interagir com o mundo (nosso repertório).
Não! Não me refiro a um mundo de zumbis vestidos com uniformes da seleção, vagando ao som de cornetas, mas sempre me surpreende pensar no quanto certos fenômenos podem influenciar o que fazemos, pensamos e sentimos, sobretudo quando os meios de comunicação têm a mesma pauta.
A outra razão é que parte significativa da agenda da temporada tem íntima relação com o primeiro tema discutido aqui: o livre-arbítrio, a crença que dá suporte à busca de culpados. Em quase todas as notícias que li, ou ouvi, e conversas de que participei, sobre o desempenho da seleção brasileira, antes, durante e após os jogos deste mundial, a tônica consistia em definir quem eram os culpados. Culpados pelos gols não feitos, pelos gols sofridos, pela escolha dos atletas convocados, pela não convocação de outros, pelas faltas cometidas, pela postura muito séria e reservada, e por tudo o que quisermos mencionar.
Ao refletir sobre o padrão de caçar os culpados (algo que me faz pensar em camponeses seguindo com tochas à casa do monstro ou em caras pintadas à Casa da Dinda) um subproduto dele decorrente sempre me vem em mente. Trata-se de um efeito colateral dessa postura: pessoas se tornam o centro do problema, enquanto o ambiente (social ou físico) que gerou e mantinha a situação é relegado a segundo plano. Encontrar e punir culpados parece produzir um sentimento de dever cumprido. Heróis de desenho colocam bandidos na cadeia, afastam seres que representam ameaças ao planeta, a polícia investiga, o ministério público denuncia, o juiz condena, os “ficha-suja” são declarados inelegíveis, alguns políticos perdem mandatos, técnicos de futebol se demitem. E os problemas continuam. Para poder atribuir culpa a algum “marginal”, produzido na miséria de uma vida cheia de adversidades, tomamos como parâmetro a exceção das exceções que “se sobressai ao seu ambiente”. Desconsideramos as particularidades de sua vida que o fizeram ser a exceção e falamos em “índole”, em “personalidade”, em “caráter”. E as mesmas condições adversas continuam a produzir mais e mais problemas.
Até quando?
No caso específico da seleção brasileira e sua atuação nesta copa, há culpados para todos os gostos, sobretudo depois da derrota para a seleção holandesa. Agora me ocorre que os holandeses podem ser os maiores culpados.
Mas eles não vão conseguir ofuscar a culpa do nosso malsinado técnico Dunga. Não me atreveria a discorrer sobre as variáveis que teriam influenciado cada uma de suas polêmicas posturas durante este mundial, mas algo que sempre me pareceu estranho foi o pouco peso dado por parte da imprensa ao seu retrospecto (bastante vitorioso, por sinal) como técnico da seleção, quando o assunto era a convocação dos jogadores. Já ouvi várias vezes que “em time que está ganhando não se meche”. Bem, ao que me parece, o Dunga treinava um time que vinha ganhando antes da Copa 2010.
Já ouvi várias teorias sobre as copas de futebol. Teorias de conspiração, de que em 1998 fizemos acordo, pago em 2002, e por aí segue a especulação. Talvez, para tornar o futebol algo mais confiável, e mesmo prazeroso, seja preciso fazer bem mais que encontrar culpados. Vai Y, chega X, e o futebol continua o que é. E como vende! E como controla comportamentos! Até nos esquecemos de que um resultado possível é a derrota! Que coisa!
Como a proposta indisfarçável deste blog é expor ideias e submetê-las à discussão, gostaria de convidar o leitor ao debate sobre a nossa obsessão por apontar o dedo, e que efeitos ela tem sobre o ambiente onde (por um pressuposto determinista) os problemas nascem, crescem, reproduzem-se e morrem(?).